IV- Boletim – EMPREENDEDORISMO SOB ANÁLISE: possibilidades ontológicas e teóricas

Ao longo dos tempos, estudar o empreendedorismo, assim como, procurar investigar como este se comporta vem se tornando cada vez mais relevante e necessário, pela disparidade de como este tema se comporta. Os estudos que emergem a partir do empreendedorismo são heterogêneos, estes transcendem de diversas disciplinas e níveis de análise (BERGLUND, 2005). 

O empreendedorismo faz parte de uma série de ações e intervenções no contexto econômico e social, passa a ser objeto de problematização e pesquisas a partir de sua necessidade, de suas implicações e de suas características (BORGES; BRITO; LIMA, 2017). Tais fatores, trazem a fragmentação do meio, bem como, o desenvolvimento de abordagens mais simples e com potencial explicativo um tanto quanto baixo (NASCIMENTO; ANDRADE, 2021).

Frente a tal abordagem, foi desenvolvido uma pesquisa, a fim de, investigar de maneira ontológica o estudo do empreendedorismo, a qual, possibilitou a identificação dos principais entendimentos no tocante a esse tema, juntamente com os pressupostos filosóficos que dão norte as pesquisas e teorias utilizadas para fomentar percepções que vem de encontro ao empreendedorismo. Tal investigação se faz relevante, pois possibilita a verificação da natureza do pensamento empreendedor, além de gerar um panorama do campo, de tal forma, que os pressupostos filosóficos principais possam ser percebidos e investigados (NASCIMENTO; ANDRADE, 2021).

Para que essa investigação se tornasse possível, foi realizada revisão integrativa, com o intuito de investigar as principais ontologias seguidas, no tocante aos estudos a respeito do empreendedorismo nos últimos quarenta e cinco anos, bem como, essas teorias foram utilizadas nas pesquisas ao longo do tempo.  Posto isto, o estudo aqui apresentado aponta as principais ontologias seguidas nas pesquisas a respeito do empreendedorismo, além dos métodos de pesquisas. Para tanto foi realizada uma revisão integrativa da literatura, a qual apontou as principais ontologias usadas nos estudos do empreendedorismo(NASCIMENTO; ANDRADE, 2021). Diante do exposto, foi possível constatar que cinco categorias surgiram, explanadas no quadro 1 abaixo:

Quadro 1 -Principais ontologias encontradas

PRINCIPAIS ONTOLOGIAS ENCONTRADAS 

Ontologia realista

Engloba estudos que utilizam uma abordagem objetiva para compreensão do empreendedorismo, com foco nas estruturas.

Ontologia idealista

Os estudos defendem a aplicação de uma abordagem subjetiva para compreensão do empreendedorismo, com foco na agência e nas interações sociais decorrentes da mesma.

Ontologia realista crítica

Abarca os estudos que defendem a compreensão da realidade a partir de estruturas distintas (natural e social), as quais possuem poderes causais interligados.

Ontologia intersubjetiva 

Encontram-se os trabalhos que buscam uma estabilidade entre questões objetivas (estrutura) e questões subjetivas (agência), não direcionando sua análise a um tópico em especial.

Ontologias alternativas.

Encontram-se os trabalhos que buscam trazer uma nova perspectiva ontológica para os estudos empreendedores, por meio da inclusão de novos elementos analíticos.

Fonte: Adaptado de Nascimento e Andrade, (2021)

De posse desses agrupamentos, foi possível perceber que os pesquisadores procuram um novo caminho em direção a pesquisa do empreendedorismo, considerando cada vez mais questões tanto objetivas quanto subjetivas (NASCIMENTO; ANDRADE, 2021)

Referências: 

BERGLUND, H. Toward a Theory of Entrepreneurial Action Exploring Risk, Opportunity and Self in Technology Entrepreneurship. 2005. Tese (Doutorado em Filosofia) – University Of Virginia, Charlottesville, 2005.

BORGES, Alex Fernando; LIMA, J. B.; BRITO, M. J. Fundamentos da Pesquisa em Empreendedorismo: aspectos conceituais, teóricos, ontológicos e epistemológicos. Encontro Nacional da Associação de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração, 2017.

NASCIMENTO, Priscilla Oliveira; ANDRADE, Daniela Meirelles. Empreendedorismo sob análise: possibilidades ontológicas e teóricas. Xlv Encontro da Anpad – Enanpad 2021, [s. l], v. 1, n. 1, p. 1-17, out. 2021.

III Boletim – AÇÕES EMPREENDEDORAS NO SETOR PÚBLICO: o desenvolvimento de uma escala

Mais de dois séculos separam os cervejeiros mencionados por Adam Smith (1976), em sua obra clássica, dos empreendedores de hoje. Os primeiros viviam em um ambiente socioeconômico caracterizado por uma relativa estabilidade. Eram detentores de ofícios cujas tradições passavam de geração para geração. Os empreendedores atuais, por sua vez, situam-se em um mundo completamente diferente, caracterizado por rápidas transformações e grande competição e são vistos como personagens multifacetados. O conceito de empreendedor é, atualmente, utilizado para designar diferentes facetas de um personagem (Gartner, 1988), tais como alguém dotado de capacidade de inovação; de espírito de iniciativa; que assume riscos em um negócio; que decide sobre o uso e a coordenação de recursos escassos, etc (VALE, 2014).

Ação empreendedora é o ato de transformar a realidade existente em novos mercados, realizando trocas aventureiras, criativas ou inovadoras entre o empreendedor e seu ecossistema de inovação ao longo do tempo (MANIÇOBA, 2019).A ação empreendedora no setor público depreende-se do impulso do intraempreendedor, empreendedor corporativo ou empreendedor institucional no esforço de agir com conseqüências políticas, econômicas e culturais. Boava e Macedo (2009) consideram essas ações como promotoras de hiatos no sentido do que é seguro e estável e, para o caso do setor público, o próprio ambiente das instituições públicas é palco de estabilidade e segurança. Os autores coadunam-se com Lecca e Naccache (2006) ao afirmarem que tais modificações praticamente não se alcançam por meio de iniciativas individuais, mas em um esforço conjunto cuja mobilização venha desencadear alianças e mecanismos de cooperação para a transformação. (SOUSA, 2010)

Assim sendo, os aspectos positivos econômicos e sociais gerados pelos empreendimentos no setor público acarretam em satisfação por parte dos empreendedores e proporcionam valores individuais, sociais e organizacionais importantes para sociedade como um todo. As novidades e criações voltadas para o atendimento do bem-estar social faz-se necessária, isto é, a incorporação do empreendedorismo na gestão pública infere que cabe aos governos reverem seus papéis no que envolve o compromisso da garantia de serviços públicos eficientes e efetivos. Temos como exemplo de Ação Empreendedora no Setor Público, O Programa de Crédito Solidário (PCS) desenvolvido em um município no Sul de Minas Gerais. 

O estudo “Ações Empreendedoras na Gestão Pública: análise do programa de crédito solidário (PCS) em um município do Sul em Minas Gerais”, de Silva, Andrade e Valadares (2016, p.64), evidencia que:

O programa pode ser considerado tanto uma política afirmativa quanto uma política emancipatória, por conceder aos empreendedores que estavam afastados do mercado de trabalho a chance de abrirem seus próprios negócios e a inserção ativa desses indivíduos na economia. É também uma ação empreendedora por se tratar de um programa novo que possui resultados constatados, o que pode ser observado por meio da abertura de novos empreendimentos e do funcionamento da feira dos membros da ALAC. O crédito também foi analisado através do nível de emancipação que foi gerado na vida de seus beneficiários. Desta forma, pode-se verificar que nos níveis econômico, social e político, o programa trouxe para os seus beneficiários aspectos predominantemente positivos. Para muitos membros da ALAC, o crédito proporcionou uma melhoria na qualidade de suas vidas, pois com o dinheiro foi possível investir em seus trabalhos que são vendidos na feira e a maior parte destas pessoas tem esse serviço como única fonte de renda. 

Nota-se uma crescente tendência de pesquisas no campo de públicas, visando compreender o papel da ação empreendedora no contexto das organizações públicas, visto que a mesma desenvolve um significativo trabalho no que tange ao desenvolvimento da coletividade da qualidade de vida, da inovação, gerando assim mudanças sociais e econômicas de um determinado grupo social. A ação empreendedora no setor público oferece a oportunidade de reexaminar o papel do governo no que diz respeito à sua responsabilidade de garantir o acesso aos serviços. 

Referências

MANIÇOBA, R. F. Ação empreendedora: Evolução, Lacunas e Tendências. In: SEMINÁRIOS DE ADMINISTRAÇÃO, novembro., 2019. Disponível em: <https://login.semead.com.br/22semead/anais/arquivos/2528.pdf>. Acesso em: 13 abr. 22

SOUSA, J. L. et al. O Empreendedorismo no Setor Público: A Ação Empreendedora da Fundação Joaquim Nabuco. In: ENCONTRO DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E GOVERNANÇA, 30., 2010,Vitória/ES. Disponível em : <http://www.anpad.org.br/admin/pdf/enapg415.pdf>. Acesso em: 13 abr. 22.

VALE, G. M. V. Empreendedor: Origens, Concepções Teóricas, Dispersão e Integração. Revista de Administração Contemporânea, 2014. Disponível em: <https://doi.org/10.1590/1982-7849rac20141244>. Acesso em: 13 abr. 22.

II Boletim – QUEM ENGATINHA APRENDE A ANDAR: a história do curso empreendedorismo na escola

Atualmente, percebe-se que as necessidades do mercado de trabalho vêm se modificando ao longo dos anos, e a educação também é parte dessa mudança que ocorre na sociedade, adotando estratégias de ensino que busca tornar o aluno como sujeito ativo no processo de ensino-aprendizagem. Diante disso, a educação empreendedora consiste em uma proposta de ensino, que aborda práticas que contribuem para o estímulo de habilidades que possam ser utilizadas em diferentes situações, e interferir no progresso dos países (LIMA et al., 2015). A formação voltada à promoção de características empreendedoras favorece esses indivíduos por meio da capacitação, inovação e do desafio de superar os próprios limites (GUERRA; GRAZZIOTIN, 2010; LIMA et al., 2014).

Diante de tais fatos foi pensado o curso de extensão de longa duração “Empreendedorismo na Escola”, com o propósito de ministrar um curso para alunos das escolas públicas do município de Lavras sobre a temática do empreendedorismo e estimulá-los na construção de atitudes empreendedoras e de novas perspectivas sobre empregabilidade. Dessa maneira, utilizou-se das metodologias ativas de aprendizagem com o propósito de tornar os alunos protagonistas do processo de ensino-aprendizagem.

Assim, propõe-se compreender a trajetória do Curso Empreendedorismo na Escola ao longo dos anos. Para isso, a metodologia escolhida foi de natureza qualitativa, por meio da aproximação entre o ambiente e o pesquisador, caracterizando-se como um estudo de caso quanto aos seus procedimentos. Foram analisadas questões como a temporalidade da execução (duração) e os materiais utilizados; atividades realizadas em sala de aula com os alunos; reuniões gerais da equipe do curso; eventos de fechamento interno e externo com os alunos e o sistema avaliativo.

Nos resultados, pode-se observar a transformação do curso desde o ano de sua criação (2015), enquanto curso de curta duração, até o ano de sua reestruturação (2018), no qual passou a ter longa duração e explorar os tipos de empreendedorismo: o privado, social, público e o intraempreendedorismo.

Nesse processo, os professores passaram a desempenhar o papel de facilitadores do ensino e não detentores do conhecimento. Ademais, verificou-se a evolução do curso entre os anos de 2018 e 2019, principalmente com a realização da feira de empreendedores mirins, o êxito quanto aos materiais didáticos confeccionados, além de estimular o comportamento empreendedor nos estudantes. 

Sendo assim, o empenho da professora coordenadora do curso, dos discentes integrantes do projeto, da coordenação da escola e o envolvimento do corpo docente com o projeto tornou possível a promoção da prática do empreendedorismo na escola, caracterizando-a como uma ação empreendedora.

Referências: 

ANDRADE, Daniela Meirelles; ASSIS, Camila; RIBEIRO, Gabrielly Fernandes; TOLEDO Ana Clara Andrade; SILVA, Sara Aparecida Marques. Quem engatinha aprende a Andar: A História do curso Empreendedorismo Na Escola. VIII Encontro Brasileiro de Administração Pública, Brasília/DF. Sociedade Brasileira de Administração Pública (SBAP), 2021. 

GUERRA, M. J.; GRAZZIOTIN, Z. J. Educação empreendedora nas universidades brasileiras. In: LOPES, R. M. A. (Org.). Educação empreendedora: conceitos, modelos e práticas. Rio de Janeiro: Elsevier: São Paulo: SEBRAE, 2010. 

LIMA, E.; HASHIMOTO, M.; MELHADO, J.; ROCHA, R. Brasil: em busca de uma educação superior em empreendedorismo de qualidade. In: In: GIMENEZ, F. A. P. et. al. (org.) Educação para o empreendedorismo. Curitiba: Agência de Inovação da UFPR, 2014.

LIMA, E.; LOPES, R. M. A.; NASSIF, V. M. J.; SILVA, D. Oportunities to improve entrepreneurship education: contributions considering Brazilian Challenges. Journal of Small Business Management, v.53, n.4, p. 1033–105, 2015.

I Boletim- Ação Empreendedora: estudo de caso em uma cooperativa

O empreendedorismo está relacionado com a forma que um determinado indivíduo é capaz de criar e desenvolver oportunidades, sendo um tema multidisciplinar (MACHADO; NASSIF, 2014). Assim, o foco deste artigo perpassa pelo empreendedorismo social, que tem como objetivo a promoção do valor social, para assim alterar uma realidade na qual ocorrem problemas sociais (GAIOTTO, 2016). 

O estudo foi realizado em uma cooperativa localizada na Zona da Mata Mineira, que representa uma forma de empreendedorismo social, visto que seu objetivo é solucionar problemas sociais existentes no ambiente em que ela está inserida (COOP, 2019). Ainda de acordo com Coop (2019), uma cooperativa é um ambiente gerido democraticamente, em que os cidadãos associam-se buscando satisfazer interesses culturais, econômicos e sociais.

A ação empreendedora foi a base de análise do estudo, já que através dessa perspectiva é possível analisar a interação entre os indivíduos e a sociedade (GOMES et al., 2013). Assim, os indivíduos atuam através da ação empreendedora, podendo realizar mudanças e impactar a sociedade solucionando problemas.

A questão norteadora deste estudo de caso foi: as ações praticadas em uma cooperativa de ensino podem ser entendidas pela perspectiva da ação empreendedora? E o objetivo geral foi analisar e entender as ações da cooperativa através da perspectiva da ação empreendedora. A pesquisa foi qualitativa, e a coleta de dados foi realizada através de entrevistas com as diretoras pedagógicas e a presidente da cooperativa, que possuíam maior experiência sobre o funcionamento da escola. 

Como resultados, a análise de uma ação da cooperativa foi feita através da ação empreendedora que é composta por sete etapas em seu ciclo: tensão institucional, lógica institucional, criatividade, inovação, liberdade, interação social e responsabilidade social. A escola/cooperativa possui um sistema bilíngue desde 2019, e são ministradas aulas de inglês de acordo com um nivelamento, em que cada aluno teria aulas de acordo com seu nível de conhecimento sobre a língua.

Assim, a tensão institucional demandou uma modificação no sistema, e os indivíduos buscaram uma solução a partir de seus valores e experiências, utilizando a inovação. Nesse caso, observou-se uma demanda com relação ao ensino de língua inglesa, pois muitos alunos da cooperativa possuíam contato com o exterior. A solução encontrada foi a inserção de mais aulas de inglês e uma interação do idioma com outras disciplinas, permitindo a prática do conteúdo. 

Constatou-se que as etapas do ciclo da ação empreendedora foram observadas durante todo o processo de implementação da solução, e que a liberdade e a interação social foram importantes para essa construção, propiciando a participação da comunidade. De acordo com a teoria da ação empreendedora, pode-se observar que ela pode ser utilizada como viés de análise em ambientes organizacionais específicos, e que o empreendedorismo social é capaz de impactar de fato a sociedade. 

 

Referências: 

[Coop], I. C. A. (2019). Cooperative Principles. GAIOTTO, Sergio Augusto Vallim. Empreendedorismo Social: um estudo bibliométrico sobre a produção nacional e internacional. REGEPE-Revista de Empreendedorismo e Gestão de Pequenas Empresas, v. 5, n. 2, p. 101-123, 2016.

MACHADO, Hilka Pelizza Vier; NASSIF, Vânia Maria Jorge. Réplica-Empreendedores: reflexões sobre concepções históricas e contemporâneas. Revista de Administração Contemporânea, v. 18, n. 6, p. 892-899, 2014.

SOARES, Marina Bastos; ANDRADE, Daniela Meirelles; ASSIS, Camila; GODINHO, Marcella de Abreu. Ação empreendedora: Um estudo de caso em uma cooperativa. VIII Encontro Brasileiro de Administração Pública, Brasília/DF. Sociedade Brasileira de Administração Pública (SBAP), 2021.